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segunda-feira, 4 de outubro de 2010


A letra brasileira de Paulo César Pinheiro
Por Daniel Brazil - 22/06/2009

Para muita gente, Paulo César Pinheiro é o maior letrista do Brasil. Suas mais de 2 mil letras produzidas, com um alto nível assombroso, são suficientes para torná-lo um caso especial da música popular brasileira. Para encarar essa tarefa monumental a jornalista Conceição Campos (foto) empenhou dez anos de trabalho. Vasculhou, catalogou, entrevistou dezenas de pessoas, conviveu com os amigos, percorreu os caminhos, freqüentou os ambientes que marcaram a vida e obra do poeta. E construiu um livro envolvente, narrado com minúcias, cujo estilo se harmoniza com o de seu biografado de maneira inteligente e saborosa.
A Revista Música Brasileira conversou com Conceição sobre o livro, que está sendo lançado em todo o Brasil (A Letra Brasileira de Paulo César Pinheiro, Casa da Palavra, 2009).

RMB - Quando e como surgiu a idéia do livro?
CC - Esse livro começou a se consolidar realmente a partir de 2007, quando consegui o patrocínio da Petrobras, que permitiu que eu me dedicasse exclusivamente a escrevê-lo. Mas a idéia – e o trabalho em torno dessa idéia – nasceu há mais de dez anos quando eu fui apresentada a Paulo César Pinheiro pelo bandolinista Pedro Amorim – parceiro dele com quem eu tinha acabado de me casar. A partir desse contato, eu fui identificando uma forte ligação entre muitas de suas letras – que até então eu não sabia de quem eram – e várias etapas da minha vida. Um tipo de relação ao mesmo tempo íntima e anônima que, depois eu constatei, se estabelece repetidamente entre os versos dos letristas e as histórias cotidianas de seus desavisados ouvintes. Desde o belo tema Pedrinho, do Sítio do Picapau Amarelo, (dele com Dori Caymmi) que eu ouvia menina, lá em Belém, até Saudades da Guanabara (com Aldir Blanc e Moacyr Luz), que eu acabara de usar como hino nos meses difíceis vividos em São Paulo. A lista era interminável. Passava por Pesadelo (dele com Maurício Tapajós) que meu pai-militante ouvia na época da ditadura, por Quaquaraquaquá e Cai dentro (dele com Baden Powell) na voz de Elis Regina, porMenino-Deus e O Canto das três raças (dele com Mauro Duarte) nas gravações antológicas de Clara Nunes, enfim a descoberta era essa: a trilha sonora de todos os meus endereços tinha sido conduzida pelas palavras de Paulo César Pinheiro sem que eu tivesse consciência disso.

RMB - Ao fazer uma leitura cronológica, é possível distinguir fases na obra de Paulo César Pinheiro? Qual a que deu mais trabalho?                                                                                                                         
CC – Ele tem fases de interesses que sempre voltam, tanto na música quanto na literatura. Eu diria que, como letrista, Paulo César Pinheiro já nasceu maduro (isso está demonstrado logo em Viagem, escrita por ele aos 13 anos). Só no seu primeiro livro de poemas (Canto brasileiro, 1976) ainda se percebe a busca por uma linguagem própria, logo amadurecida nos livros seguintes. Décadas mais tarde, ao escrever os belos poemas do livro Atabaques, violas e bambus, Paulo César Pinheiro mergulhou de forma tão certeira naquele universo africano e indígena, que a Luciana (Rabello, sua esposa) brincava dizendo que ele estava incorporado. Eu poderia até dizer que, por conta do vocabulário muito específico, essa fase “deu trabalho”, mas era uma dificuldade instigante e logo superada pelo ritmo que vinha junto, o encadeamento dos versos. Então o prazer da leitura se estabelecia de imediato. A sua poesia é muito rica de música, e vice-versa.
RMB - É comum lermos biografias de compositores com a obra acabada, consolidada. Paulinho não pára de compor, até hoje. Imagino que enquanto você escrevia o livro, ele deve ter acrescentado mais algumas dúzias de composições ao acervo. Isso não é meio desanimador para quem quer analisar um conjunto de obras?                                                                                                                                                                                                                                           
CC - É e não é. Quando eu disse a ele, em 1995, que queria escrever um livro sobre a sua obra, ele sorriu me prevenindo: É muita coisa...Em pouco tempo, perdida entre as estantes empoeiradas de lojas de vinil, discotecas de rádios (a Rádio Nacional no Rio, a Rádio Cultura de São Paulo) e inúmeras discotecas particulares, eu entendi exatamente do que é que ele estava falando. Era muita coisa mesmo. No livro estão contabilizadas mais de duas mil letras feitas com mais de 100 parceiros, metade das quais gravadas por mais de 500 intérpretes, desde Elis Regina, Elizeth Cardoso, Clara Nunes, Nana Caymmi, MPB-4, Roberto Ribeiro, Amélia Rabello, Paulinho da Viola, Elba Ramalho, até Renato Braz, Mônica Salmaso. É uma lista interminável, porque está sempre crescendo. Tenho orgulho de ter enfrentado esse desafio porque o resultado de todo esse esforço diz para o leitor com toda clareza: há muita coisa boa sendo continuamente criada e, no meio desse oceano musical brasileiro, a arte de Paulo César Pinheiro tem sido um farol poderoso.

capa do livro

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